As dificuldades da sucessão, nos negócios familiares

As dificuldades da sucessão, nos negócios familiares

As empresas familiares são um pilar essencial da nossa economia, quer olhemos num panorama nacional, quer num panorama internacional. Não obstante, cada vez mais deparamo-nos com o problema sucessório que implica a ponte entre o fundador ou fundadores e as gerações futuras.

O problema principal nessa ponte assenta, essencialmente, no planeamento estratégico desta mesma sucessão. A transição de gerações é um ponto essencial de qualquer planeamento de uma empresa familiar. Um processo de sucessão bem planeado significará a convergência da empresa familiar, que se atualiza e renasce num paradigma de evolução, vocacionada para um crescimento e profissionalização duradouros. Para tal, é importante que as empresas familiares desenvolvam essa estratégia o mais cedo possível, antes dessa passagem de testemunho. Verificamos, ao analisar toda a mecânica das empresas em questão que, essa estratégia acaba por não ser definida, na maioria das vezes, porque as empresas estão preocupadas com a gestão do dia-a-dia e acham que a médio prazo tudo se resolverá. O que, de facto, não acontece.

Também não é de menor importância o choque de ideias geracionais que se materializa numa incapacidade de os fundadores delegarem nas gerações seguintes, as grandes decisões relativas ao futuro das empresas. A verdade é que, ainda que possam estar afastados, a grande maioria, nunca o faz totalmente e, muitas vezes fá-lo, em simultâneo, com uma liderança posterior. Muitas destas pessoas dedicaram tanto tempo às suas empresas que, após uma teórica retirada, acabam por não desenvolver quaisquer hobbies ou outros focos de interesse em matérias mais diversificadas, o que contribui para não se desligarem dos negócios.

Num estudo desenvolvido, em 2016, assente num inquérito desenvolvido pela Pricewaterhousecoopers, a empresas familiares, é feita a referência aos principais passos para um planeamento eficaz na sucessão. São medidas objetivas de liderança e de propriedade, de fácil execução que, ao serem bem implementadas, podem fazer toda a diferença neste processo. A título de exemplo podemos falar das seguintes:

  1. A experiência deve ser obtida fora da empresa familiar, ou seja, é importante trabalhar fora, desenvolver um plano de carreira de forma a que se adquira as competências específicas de que a empresa familiar necessita;
  2. Deverá ser desenvolvido um plano estratégico para o médio prazo. Verifica-se que a geração seguinte encara o processo sucessório como uma oportunidade de modernizar a empresa, e muitas das vezes existe essa necessidade. Estas mudanças devem ser implementadas num contexto de objetivo a longo prazo e desenvolvido, ainda, pela geração atual e a geração seguinte;
  3. É de suma importância que, à medida que o negócio passa de uma geração para a outra, seja criada uma estrutura organizacional que não dependa de uma única pessoa. As decisões devem ser tomadas coletivamente entre ambas as gerações.
  4. As gerações que irão suceder, devem fazer parte do conselho de administração, quando o houver, de forma a que a preparação e mecanização de todos os procedimentos e decisões importantes seja, desde logo, uma realidade corrente.
  5. Outro passo de maior importância, consiste em deixar claro o que a geração atual fará quando se reformar. Desta forma consegue-se evitar a tentação de interferências futuras.
  6. A necessidade de comunicação é fundamental, ou seja, as decisões não devem ser ditadas pelo proprietário, mas sim através de um processo de consulta e discussão onde deverá ser dada a palavra a todos aqueles que tenham lugar no futuro.
  7. Fazer o trabalho de casa, do ponto de vista legal. É de suma importância que exista um esclarecimento cabal das implicações legais e fiscais do plano sucessório.
  8. A construção de ativos fora da empresa familiar. Quando a geração que está em vias de se reformar depende, inteiramente, da mesma para lhe garantir uma pensão, está a contribuir para um esforço que pode ser desmesurado no negócio e aumentar a dificuldade em “desprender-se” do mesmo. Recomenda-se, por isso, que se comece desde cedo a construir ativos fora da empresa.

 

Outro aspeto importante e que muitas das vezes dificulta o processo sucessório é o da temática da transferência de riqueza entre as gerações, isto significa que as famílias, por regra, não comunicam com frequência com os aspetos relacionados com o aumento e proteção da fortuna da família, tornando-se um assunto muitas das vezes “tabu” entre os membros.  Como resultado disto podemos ter pessoas com expetativas diferentes com sentimentos de privilégio distintos e que podem originar potencias conflitos.  Recordemos o que diz o ditado: as famílias fazem fortuna na primeira geração, desfrutam-na na segunda e perdem-na na terceira. Na maioria das vezes, é verdade. Podem contribuir para tal, para além de um mau processo sucessório, questões como um crescimento mal sustentado, excesso de gastos pessoais e litígios.

Somos de opinião que a próxima geração é ambiciosa, proativa e muito aberta à mudança. Querem, fundamentalmente, que o negócio não perca identidade com a origem, mas que seja diferente do que aquilo que herdaram, isto significa, que querem inovar com produtos e serviços para o mercado e têm interesses em novos locais de negócio. É uma era globalizada e, muito provavelmente, iremos assistir nos próximos anos a toda esta manifestação prática a nível de mercado. São uma geração que tem uma grande familiaridade com a tecnologia digital, estão bem preparados academicamente o que lhes traz novas ferramentas para realizar um planeamento estratégico eficaz e que continue a perpetuar o negócio familiar.

Autora: Sílvia Resende, Partner/Advogada na Lacerda Dias & Associados- Sociedade de Advogados, R.L

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